Este
da foto é Sócrates, na copa de 1982 ou 1986 (copiei do Blog do JucaKfouri). Não sei a data exata, mas sei a diferença que ele fez no futebol brasileiro como jogador e esperava que fizesse muito mais como dirigente em um futuro bem próximo. Não vai acontecer, pois ele faleceu na madrugada desse domingo.
Ele era jogador do Corinthians no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, depois da Fiorentina na Itália,
que decretou luto e fez seu minuto de silêncio no jogo de hoje contra a Roma em
homenagem ao “Dottore”. Retornou ao Brasil e passou por Santos e São Paulo.
Sócrates foi um dos grandes jogadores do futebol
mundial. Era médico de formação, jogador por paixão. Um médico jogando futebol
profissional! Que beleza! Que magia e sedução tem o futebol brasileiro...
Lembro de pensar algo do tipo quando soube disso, creio que na copa de 1986... Já o chamavam de doutor em 1982, mas não sabia o motivo.
Entretanto, o que mais me lembro
de Sócrates é que, na minha pré-adolescência e adolescência, ele comandava a
seleção brasileira. Era longilíneo e elegante, com toques sutis, inteligentes,
mas também com chutes fortes (quem não se lembra do gol na Copa de 1982 contra
a Rússia?) e aquele passe mágico de calcanhar... Ah, aquele passe de calcanhar
só era igualado pela magia dos passes de Magic Johnson... Era uma surpresa para
os adversários e uma beleza para os jovens do início dos anos 1980... Como ele
ousava fazer aquilo? Magnífico!
Além disso, diziam
que ele comandara a tal democracia corintiana. Mas o que era isso? Os times não
tem democracia para que seja preciso exaltar um que a tenha? Vivíamos na
ditadura. Eu muito jovem ainda não entendia muito bem tudo aquilo... Sem
internet, sem muito acesso as informações do centro do país, do mundo. Só
sabíamos o que a grande mídia queria que soubéssemos e – como a grande mídia
era aliada da ditadura – acabávamos sabendo pouco de tudo que verdadeiramente
interessava ao país.
Mas Sócrates – longilíneo,
elegante, líder das equipes que passou – era feroz fora dele também. E assim
ele viveu, dentro do Corinthians, dentro da seleção e depois que se aposentou.
E agora, longe do campo, continuou brigando por anos contra esses que manobram,
desqualificam e mediocremente comandam o futebol no país. Abre o olho Ronaldo,
eles vão roubar tua alma...
Sócrates comemorava
um gol com o punho cerrado, copiando o Reinaldo (outro grande ícone do futebol
brasileiro, herói do Atlético Mineiro e da seleção) que, por sua vez, imitava
os Panteras Negras. E esse gesto de envolvimento com as grandes causas ele
carregou consigo.
As
atitudes de Sócrates poderiam muito bem ser representadas na frase de Jean
Jacques-Rousseau: "Renuncia à
liberdade é renunciar à qualidade de homem". E assim, com a distância
histórica entre os pensadores e o protagonista, me parece que ele viveu como
uma das citações do filósofo Sócrates que mais gosto e já destaquei aqui muitas
vezes:
“e, embora os oradores estivessem prontos a
me acusar e me prender, e vós os encorajásseis vociferando, mesmo assim, achei
que me convinha mais correr perigo com a lei e com o que era justo, do que, por
medo do cárcere e da morte, estar convosco, vós que deliberáveis o injusto”.
Para os jovens, me
parece, era só mais um ex-jogador reclamando, sem nada para dizer e em busca de
espaço na mídia. Não era isso e creio que se não fosse por essa leitura
equivocada e a falta de politização entre os atletas, as regras do jogo seriam
outras, os desdobramentos dessa copa bilionária não estariam cheios de
superfaturamento e lucros com destino incerto – em tese, pois sabemos para onde
vai o saque, como na África do Sul. Se fossemos um povo mais informado, mais
envolvido com nosso próprio dinheiro, Dr. Sócrates já seria o mandatário maior
do futebol brasileiro, assim como Platini foi na França na Copa de 1998 e agora
é no velho continente, na UEFA. Formação, capacidade e desinteresse no dinheiro
do esporte ele tinha. E assim faríamos uma grande Copa, com grandes
repercussões no nosso futebol e na sociedade, especialmente nas cidades-sede de
2014.
Infelizmente
os brasileiros não se posicionam, não seguem os grandes exemplos e não
valorizam os grandes brasileiros quando estão em vida. Foi assim com Ulisses
Guimarães e com Brizola na volta do exílio. No esporte é exatamente a mesma
coisa. Se mais atletas se preocupassem com sua formação durante essa fase, mais
teríamos mais líderes capacitados, outros Sócrates se formariam e não se
esconderiam em cargos como laranjas dos cartolas. Isso seria positivo para o
futebol, o voleibol, o atletismo, o remo... E, óbvio, para o basquete também!
Enfim,
essas coisas terão de ser geridas por outro grande esportista, quiçá da mesma
geração, mas que sua marca fique além dos gramados: fique na nossa retina como
exemplo de brasilidade. Muito obrigado doutor Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza
Vieira de Oliveira. Paz e luz!
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