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Bate papo com Marcel

Camisa 11 eternizada pelo Ala

   O esporte é feito por grandes nomes, por atletas que tornam-se lendas por conta de seus grandes feitos e tive a honra de entrevistar um dos maiores nomes do basquete brasileiro. Teve várias conquistas marcantes representando o Brasil, terceiro lugar no mundial de 1978 anotando a cesta da vitória no estouro do cronometro. Vintes anos atuando pela seleção, o jogador com mais partidas disputadas (392) e segundo maior cestinhas (5297 pontos), atuou em quatro Jogos Olímpicos (Moscou, 80; Los Angeles, 84; Seul, 88 e Barcelona, 92), cinco Mundiais e cinco Pan Americanos, tendo a conquista de 87 como maior feito.
   Trago um bate-papo com Marcel Souza, um dos melhores atletas brasileiros da história do basquete, sobre sua carreira como atleta e treinador e o futuro da modalidade. De antemão obrigado Marcel pela oportunidade, e por tudo que fizesses pelo basquetebol brasileiro.
   
1- Como conheceu o basquete, seu primeiro contato?

MARCEL: Eu não me lembro disso, porque meu pai jogava e eu me lembro de ter bola de basquete, brincar com bola de basquete quando eu tinha dois anos de idade, 3 anos de idade então, é o basquete sempre esteve na minha vida. Acompanhava meu pai nos jogos, carregava a mochilinha dele com a toalhinha o calção pra ir no treino, no jogo. Queria jogar junto, fui crescendo nesse ambiente esportivo por que meu pai jogava basquete, no Círio inclusive de São Paulo, é um jogador que hoje jogaria no NBB.

2- Quem foi sua maior inspiração no começo da carreira?

MARCEL: Meu pai, eu queria jogar como o meu pai, isso estava muito claro pra mim. Eu queria ser quinem ele, e jogar, e ele nunca chegou a seleção brasileira nunca foi pra Olimpíada, nem nada né. O que eu via era ele jogar e trabalhar, e era essa minha inspiração.

3 - Como eram os treinos e a estrutura para o basquete?

MARCEL: Bom o treino era bem amadorístico, sempre tinha alguém, um mecenas, um grupo que ajudavam. Você tinha que levar o seu material, tinha que comprar o seu tênis, não tinha uniforme de treino. Tinha aquele uniforme de jogo que ficava com o roupeiro e as quadras, já treinei em quadra, já joguei em quadra de cimento, quadra aberta, bola de capotão da drible, era bem rústico. Depois começou a chegar o progresso, que era o tênis Converse Chuck Taylor que hoje é sucesso nos pés das meninas, que tem aquelas cores, cor de rosa, preto, verde, que pra nós era o máximo na época e o meu primeiro durou 3 anos, e dei prum cara do meu time. Aí comprei o segundo que estourou logo, eu peguei de volta aquele e só aposentamos porque aquela sola de borracha furou, ai não podia mais jogar, eu até na seleção jogava com aquele tênis, porque não tinha isso aí. O uniforme era de algodão, aquele tênis era de lona, você treinava, suava, aquilo molhava você ia pra seleção treinava de manhã e de tarde, a tarde ele tava encharcado. Na outra manhã ele não secava, tinha que deixar no sol, o aro era duro, não balançava, então era tudo assim, não se ganhava nada. Você vê esses nossos ídolos aí, do futuro e do passado foram campeões mundiais, medalhista de olimpíada tudo jogando desse mesmo jeito, eles ganhavam o que? Uns troco, as vezes, pra né? Um presentinho, não tinha essa estrutura que tem hoje assim.

4- Por quais clubes passou?

MARCEL: Bom, eu comecei a jogar no Corinthians, no pré-mirim  que era o sub 12, sub 13, e eu comecei jogando lá. E ai meu pai me levava ou arranjava alguém pra me levar, de Jundiaí pra SP três vezes por semana pra jogar lá, nos fins de semana também. Aí voltei pra Jundiaí, fiquei aqui uns três quatro anos, fui pra seleção brasileira jogando pelo Jundiaí, jogava três, quatro categorias, a história de todo mundo. De Jundiaí eu fui pro Sírio, onde o Sírio eu fiquei um tempão, eu só parei um ano pra jogar nos EUA na Bradley University e joguei até ir pra Itália. Aí na Itália eu fui jogar no time do Oscar, em Caserta, terminou a temporada, eu não voltei, fui jogar no Montelibano, com o Edvar, onde nós ganhamos quase tudo como o Sírio, só não ganhamos o mundial, perdemos por um ponto pro Barcelona em Barcelona. Um jogo que o juiz fez o que pode pra fazer a gente perder e conseguiu, perdemos por um ponto, nós ganhamos toda a sequência que o Sírio ganhou, menos o mundial. Aí de lá eu voltei pra Itália, joguei em Fabrano, joguei quatro anos em Fabiano com uma breve passagem no Corinthians adulto, de seis meses, numa época ali. Quando acabou minha temporada na Itália eu voltei pro Montelibano, joguei um ano no Montelibano, depois joguei dois anos em Santa Cruz do Sul e daí joguei mais um ano no Sírio, de volta e mais um ano no Palmeiras. Esses foram os clubes pelo qual eu passei, depois joguei como convidado por Franca numa Copa William Jones, a mesma coisa pelo Vila Nova de Goiás, essas coisas assim, mas eram torneios não eram campeonatos.

5- De todos os títulos com os clubes por onde passou, qual deles foi o mais marcante?

MARCEL: O mundial de clubes do Sírio em 79, onde se fosse nos dias de hoje ia ser um time americano, dois times da Europa e dois times da América, quer dizer. Ia ser um time argentino, um time americano, dois times da Euroliga. E nós ganhamos, fomos campeões, ganhamos dos dois times da Euroliga, então isso foi uma marca até hoje né, 79.

6- Por qual equipe teve mais conquistas?

MARCEL: Pelo Sírio né, porque eu joguei mais tempo lá, em todos os times eu tive alguma conquista. Pelo Sírio nós ganhamos quase duas vezes a mesma coisa, Estadual, Brasileiro, Sul Americano e Mundial. Nós quase repetimos isso, duas vezes.


Uma de suas passagens como treinador


7- Quando tu pensou em ser treinador? Como foi essa decisão?

MARCEL: Foi automático, eu nos meus últimos anos, no meu último ano de seleção, eu tava na Itália. Eu via o basquete, comecei a ver o basquete de outro jeito, mais distanciado do que da quadra, vendo o que eu podia fazer e aí a hora que eu terminei minha carreira, meu último jogo foi numa sexta feira, Palmeiras e Santa Cruz do Sul. O Palmeiras foi meu último time, terminei a minha participação como jogador e virei técnico no domingo, fui contratado por Garulhos, foi uma coisa assim, muito natural a passagem, então a gente nem sente. Sente depois que vira treinador.

8- Como treinador qual a sua maior conquista e a maior dificuldade?

MARCEL: Minha maior conquista foi fazer com que todos jogadores que passaram por mim, se tornarem melhores. Todos eles, de uma certa maneira, eu consegui somar a carreira deles, principalmente os jogadores menos talentosos. Eu consegui da uma nova visão do jogo pra eles, isso é a minha maior conquista. E a minha maior dificuldade foi justamente ser entendido pelo sistema, a medida que eu ia colocando as minhas ideias isso estranhava muito, coisas que eu falava no século passado hoje ta em moda né? Ai a turma que trabalhou comigo fala, po você falou isso em 96, 97, agora que o cara ta falando. Você falava no ano 2000, então é, tive grande dificuldade em passar o que eu acreditava. A minha última experiência no Pinheiros foi traumatizante, porque ninguém entendeu minha proposta, assim eu tive que parar e imitar o que todo mundo fazia como técnico porque ninguém estava aceitando aquelas coisas que eu tava falando. Aí eu resolvi parar de ser técnico, então se eu não posso fazer o que eu quero, eu não vou imitar os outros.

9- Tu fez parte de uma das melhores gerações da história do basquete, sendo um dos grandes nomes da nossa seleção. Como enxergas o futuro da nossa seleção?

MARCEL: Está cada vez mais difícil conseguir um lugar ao sol no basquete internacional. Porque o número de jogadores, a NBA abriu pra todo mundo então elevou o nível do basquete mundial. Então os nossos melhores jogadores estão jogando fora, perdem as suas características que a gente tem, que seria nossa vantagem né? Os jogadores de base já vão, tipo assim, Tiago Spliter com 13 anos já foi embora pra Espanha. O Varejão com 17 anos já foi embora pra Espanha. O Nenê com 19 já foi pra NBA, eles perdem as características dos jogadores brasileiros, começam a se tornar muito especialista, e aí quando você chega pra jogar esses jogos você sente muito.

10- Falta um trabalho mais adequado nas categorias de base?

MARCEL: O técnico de categoria de base ele é pressionado pelo sistema a vencer a qualquer custo, a ganhar campeonato, ele é avaliado pelo número de títulos que ele conseguiu na carreira. Então quando você fala com o cara, ah esse foi um cara que chegou na seleção e ganhou todos os títulos da carreira, de sub 12, sub 13, sub 15 e agora tem a chance dele na seleção e afunda. Por quê? Porque a categoria de base como o cara é pressionado a vencer a qualquer custo, ele passa a esconder os defeitos dos jogadores invés de corrigir e passa a valorizar as qualidades dos jogadores, e aproveitar delas e não ensina outra coisa além de insistir naquela qualidade. Então se o cara é um arremessador ele pouco se preocupa com a defesa desse cara, como ele defende, como ele passa, como ele dribla, se ele é um bom chutador, vamos fazer jogadas pra ele chutar e ele fica lá atrás não precisa defender né? Se ele é um cara, pivozão de força assim, ensina o cara a pegar rebote e só, e dar pancada no bloqueio e não procura ensinar o entendimento do jogo. Então eu sempre digo, que a gente é muito bom, todos os técnicos por causa disso, nós somos muito bons pra ensinar os fundamentos do jogo, ensinar a arremessar, ensinar a passar, mas nós pecamos muito porque não ensinamos quando fazer isso no jogo, saber quando se passa, quando se arremessa, quando se dribla, como se movimenta, como se enxerga o jogo é fundamental isso na categoria de base. Tem que ser ensinado, e não dá, porque isso leva tempo, trás pouco resultado, então é melhor valorizar as qualidades dos jogadores.

11- Quatro anos depois, como o senhor avalia o esporte brasileiro em geral e o basquete, particularmente, pós Jogos Olímpicos do Rio 2016?

MARCEL: Nada mudou no esporte brasileiro, e no basquete muito pelo contrário, porque com esse Covid, o novo governo que entrou, todos aqueles investimentos que tinham muitas nuances de como ele era investido, sumiram. E consequentemente, isso afeta os atletas muito, então quando ta tudo querendo se adaptar a nova situação entra o Covid e adia Olimpíada, adia tudo. Agora que tá começando a ter campeonato por ai de futebol, mas basquete ainda não começou, vôlei ainda não começou, imagina os esportes individuais, o atletismo, que viviam desse investimento. Então tá tudo parado eu acho.

12- Comparado com o século passado, quando tivemos conquistas internacionais, o nível técnico do nosso basquete evoluiu, estacionou ou regrediu? Por quê?

MARCEL: Eu acho que evoluiu, o grande problema é que, como o basquete mundial mudou com a abertura do mercado, porque a NBA era um mercado muito fechado. Pra você jogar na NBA eles pegavam jogador do College, do universitário, então tinha que jogar o universitário pra ser escolhido. Pouco a pouco eles começaram a abrir isso, a NBA nos anos 80, no século passado ela não transmitia jogos, ela queria que os patrocinadores dela fossem os patrocinadores, botava mil dificuldades pra transmitir um jogo da NBA e isso foi caindo com o tempo. Eles perceberam que o mercado internacional era muito maior que o mercado americano pra NBA, e eles abriram como a fórmula 1 faz, eles começaram a trazer, ter uma reserva de mercado de 30% pra jogador estrangeiro. São 450 jogadores da NBA, porque são 30 times com 15 jogadores, você pode ver que tem mais ou menos 150 estrangeiros, dos mais diversos países por quê? Pra entrar nesse país, ó vai jogar o Leandrinho hoje contra o Varejão, o Brasil inteiro assiste, o Ginobili contra o Scola, nossa senhora a Argentina inteira assiste, e assim vai ma Europa, Pau Gasol, todos esses. Então isso evoluiu o basquete internacional, os jogadores passaram a ter outros exemplos, na minha época a gente via o jogador americano na Olimpíada, no Pan Americano, no Mundial, ali que você via os melhores. Agora você vê os melhores na televisão da sua casa, o cara cresce, o objetivo do jogador brasileiro hoje é ser jogador da NBA, o nosso nível aumentou, mas do mundo inteiro aumentou muito mais, é uma dificuldade muito grande ter uma conquista internacional. E isso, nós estamos lutando com isso, porque passa pela categoria de base, como que se ensina o jogador, e a gente já discutiu.

13- Na sua opinião o que falta para o Brasil evoluir e ser uma força mundial?

MARCEL: Bom, evoluir vai muito de treinamento, o que acontece hoje é que a gente imita o que tá acontecendo lá fora. Então os caras ficam vendo jogos, palestra de técnicos e começa a imitar. Não tem a sua interpretação daquilo pra nossa realidade, isso gera um conflito que diminui a nossa força. Os nossos melhores jogadores estão na NBA, jogam 10 meses por ano, você não consegue trazê-los pra cá um mês e transformá-los em um jogador adaptado ao sistema brasileiro de jogo. Eles estão lá na realidade deles, e aí fica difícil a adaptação. Os nossos melhores jogadores da categoria de base estão fora do país já, porque os observadores, agentes, vão tudo ver jogo de sub 14, sub 13, sub 15 e pinçam aqueles melhores pra levar pro Real Madrid, Barcelona, pros EUA, agora a NBA tem aquelas clínicas que eles dão estudo, ensinam o jogo e a gente perde nossa identidade né? Ai temos que recuperar a nossa identidade.

14- Como foi fazer uma dupla bem sucedida com o Oscar e atuar com grandes nomes do nosso basquete?

MARCEL: Uma experiência única, porque nós fizemos uma boa dupla. Um puxava o outro, o outro puxava o um, era uma rivalidade muito boa, e quem ganhou com isso foi o basquete brasileiro.


Equipe campeã do Pan Americano de 1987


15- O título do Pan Americano foi o maior e mais importante da sua carreira?

MARCEL: Sim foi, e foi o maior e mais importante dos últimos 33 anos do basquete masculino. O mais importante título que o Brasil teve nos últimos 30, 33 anos.

16- No atual cenário político, como o esporte pode se desenvolver pensando no futuro da modalidade?

MARCEL: Não vejo com grande preocupação porque temos coisa mais urgentes mundialmente falando, a pandemia, tudo vai redimensionar a vida da gente. Então, falar em política, nada, temos que tentar continuar vivendo e a partir daí desenvolver, você vê cancelou Olimpíada. Eu não acredito que a Olimpíada vá sair em 2021 com esse cenário que tá aqui agora, mais a gente espera que tudo melhore.

17- Quando falamos de basquete logo lembramos dos Estados Unidos. Eles serão sempre a referência para os demais países?

MARCEL: Sim, serão porque eles tem mais praticantes que todo mundo. Eles têm mais experiência, melhores campeonatos, e estão pegando todos os melhores jogadores do mundo e levando pra lá. Não é replicável o que os EUA fazem no esporte em outros lugares, você pode ver que todos os outros países concentram o esporte em determinado lugar, um determinado número de pessoas. Lá eles têm milhões de pessoas jogando todos os esportes, então eles tem uma vantagem muito grande.

18- Deixe um recado para nossos leitores.

MARCEL: Queria deixar meu abraço a todos, e que vocês prestigiem bastante o nosso basquete!

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